Hoje escrevi sobre algo que aparece com frequência na clínica com adolescentes — mas também nas escolas, nas famílias, nos vínculos: o silêncio.
Aquele que desconcerta. Que interrompe o fluxo das perguntas. Que parece resistência, desinteresse ou desafio.
Há adolescentes (e há pessoas adultas) que falam muito. Gritam, gesticulam, provocam, marcam presença. E há aqueles cuja linguagem é o silêncio. Não é um silêncio vazio, mas um silêncio carregado, algumas vezes até pesado. Um silêncio que desconcerta, porque escapa da lógica de que “conversar resolve”. Um silêncio que às vezes responde com um “não sei”, um corpo retraído ou um simples dar de ombros.
Mas silêncio não é ausência. O poeta Roland Barthes escreveu que “o silêncio é uma palavra em si”, porque comunica, contesta e protege. Ele tanto pode ser pausa, recusa, como pode ser estratégia. No adolescente, o silêncio pode ser tudo isso junto.
Sempre me perguntam o que fazer com o silêncio na clínica. E essas perguntas sempre vêm de um lugar de urgência. Pais e profissionais questionam: “ele está com raiva?”, “está deprimido?”, “está me testando?”
Psicólogos, apressadinhos como são, vão logo para a interpretose: “esse silêncio é sintoma”, “é resistência”.
Mas e se for só silêncio mesmo?
Silêncio legítimo. Silêncio como gesto. Como modo de preservar algo para o qual ainda não existe palavra. O silêncio pode conter o excesso de pensamentos, emoções, expectativas e imagens. Pode ser que na verdade, falte palavra para dar conta disso tudo.
Então o adolescente se cala. Ou melhor, ele fala com o silêncio.
E nem todo adolescente que se cala está deprimido. Às vezes ele está se protegendo, ou pode ser que haja uma complexidade muito maior que envolve segredos e tramas relacionais muito delicadas de serem ditas assim, a partir de um roteiro de perguntas.
O mais difícil para quem está do outro lado é sustentar a dúvida. Por isso, te digo, não precisa recorrer a uma parafernália de técnicas e instrumentos para conseguir conversar com adolescentes. Esses recursos são úteis, mas não substituem a presença e escuta real, o estar com. Porque não é a técnica que escuta. É a pessoa.
A escuta envolve não se apressar, não invadir o silêncio e em arrancar sentido que não existe. A escuta envolve dar o espaço necessário para que o adolescente diga quando puder dizer. Com palavras, pausas, gestos ou mesmo com o silêncio.
Cabe ao interlocutor permanecer com delicadeza e presença.
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